segunda-feira, outubro 7, 2024

Governo insiste no trabalho aos domingos, flexibilizar segurança e terceirização

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Sem resolver o drama dos desempregados que esperam o auxílio emergencial, Bolsonaro dá prioridade a consulta pública de retirada de direitos trabalhistas

O Congresso adiou para esta semana a votação de um novo auxílio emergencial para trabalhadores desempregados e informais, que deveria ter ocorrido no último dia 25 de fevereiro. Além de não pressionar pela aprovação da medida, o governo de Jair Bolsonaro (ex-PSL), investe em ações que visam tirar mais direitos trabalhistas.
Em meio a briga dos senadores de oposição e até da base aliada do governo para impedir que o auxílio só seja aprovado se junto a Casa aprovar o fim da obrigatoriedade de piso mínimo de gastos na saúde e na educação,  Bolsonaro e Paulo Guedes, ministro da Economia, prorrogaram até 6 de março de 2021, o prazo sobre uma consulta pública de “disposições relativas à legislação trabalhista que institui o Programa Permanente de Consolidação, Simplificação e Desburocratização de Normas Trabalhistas e o Prêmio Nacional Trabalhista”.
O nome pomposo esconde a que veio: mais perdas de direitos trabalhistas, indo além dos mais de 100 itens da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que já foram retirados com a reforma Trabalhista de Michel Temer (MDB-SP), em 2017.
Entre os itens para consulta pública (alguns caíram com a não aprovação da Medida Provisória nº 905), três deles chamam a atenção por serem extremamente prejudiciais aos trabalhadores: a ampliação do trabalho aos domingos e feriados; a flexibilização de normas de segurança e saúde do trabalho e a que dificulta a ação dos fiscais do trabalho em multar a “empresa mãe” em casos de terceirização.
Sobre o trabalho aos domingos e feriados, o secretário de Trabalho do Ministério da Economia, Bruno Dalcolmo, afirmou ao jornal O Estado de São Paulo, que o governo apenas está eliminando a “etapa burocrática” da negociação coletiva para permitir a adesão do setor. Ou seja, o governo quer que o trabalhador aceite trabalhar aos domingos e feriados, sem que tenha a proteção do sindicato da categoria. Atualmente o trabalho aos domingos está liberado para algumas categorias. Esses trabalhadores têm direito somente a um descanso aos domingos a cada sete semanas.
Para o secretário de Relações de Trabalho da CUT, Ari Aloraldo do Nascimento, o pano de fundo da consulta pública de regulamentação dessas matérias nada mais é do que tirar os sindicatos das negociações para que os patrões possam “escravizar” os trabalhadores e aprofundar a reforma Trabalhista.
“Eles querem tirar os sindicatos de toda e quaisquer negociações por que nós atrapalhamos os planos do governo e dos empresários. A extinção do Ministério do Trabalho, rebaixado a secretaria, já sinalizava que para este governo não existe trabalhador, existe colaborador”, diz Ari.
Outro ponto polêmico é sobre mudanças nas normas regulamentadoras (NRs). A Consulta Pública tem um trecho em que coloca “o livre exercício da atividade econômica e a busca do pleno emprego” como princípios para a elaboração das normas regulamentadoras relacionadas à saúde e à segurança do trabalhador. Mas, pela legislação, as mudanças só podem ser feitas a partir de um consenso num conselho tripartite envolvendo representantes dos trabalhadores, empresários e o governo federal.
O desprezo com a saúde e os cuidados para evitar acidentes é motivo de chacota pelo secretário de Trabalho do Ministério da Economia, que na entrevista ao Estadão, disse que “a única maneira de ter risco zero à saúde e à segurança do trabalhador é não ter atividade produtiva nenhuma”.
“O secretário do Trabalho não tem a menor noção do mundo do trabalho. Ele não vê a diferença entre quem trabalha em meio rural, nas minas, na energia, com risco à saúde, com quem trabalha em outra atividade, dentro de um escritório ou em home office.  Ele não enxerga que as normas regulamentadoras são diferentes para cada setor”, diz o dirigente cutista.
Sobre o trecho que não responsabiliza as ‘empresas mães’, que contratam terceirizadas, dizendo que não há vínculo empregatício entre a empresa contratante e o prestador de serviços, salvo em casos de fraude, o secretário de Relações de Trabalho da CUT, lembra o caso emblemático do trabalhador João Alberto Silveira Freitas, assassinado por agentes de segurança terceirizados do supermercado Carrefour, em Porto Alegre (RS), em novembro do ano passado.
“Este é um exemplo de como é muito fácil para uma empresa contratante não ter responsabilidade sobre os atos de outros funcionários, e das diretrizes recomendadas pela direção de uma empresa terceirizada”, diz Ari.
Para ele, a terceirização permite a pejotização do trabalhador, que é o contrato como Pessoa Jurídica (PJ), sem proteção sindical.
Naquele país, a população foi às ruas em protesto contra os baixos valores pagos nas aposentadorias, por estar descontente com o modelo socioeconômico neoliberal, o aumento nas tarifas de transporte público, o aumento do custo de vida, a corrupção e abusos de autoridade, o conluio em medicações e bens de necessidade, o aumento na criminalidade e da desigualdade de renda e alto custo de vida, a mesma situação que o Brasil vem passando.

Juízes, advogados e auditores fiscais do Trabalho criticam Consulta Pública

A Consulta Pública foi criticada pela Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra) em nota conjunta assinada pela Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho (ANPT), Associação Brasileira dos Advogados (Abrat) e pelo Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais (Sinait). As entidades veem “inovações e inconstitucionalidades no texto”, já que a minuta de decreto presidencial “apresenta princípios próprios e normas diferentes das previstas na Constituição e nas leis, em violação ao processo legislativo”. Na visão da entidade, o texto promove “alteração da lógica protetiva da legislação trabalhista”.
O Fórum Interinstitucional de Defesa do Direito do Trabalho e da Previdência Social (FIDS), que reúne entidades de representação do mundo do trabalho e do campo social, endossou as críticas à Consulta Pública. Para a entidade, sem diálogo com a sociedade, a decisão do governo é um desrespeito à democracia e a soberania, ou seja, ao Estado Democrático de Direito.
Em nota, o FIDS diz que “sob o falso argumento da desburocratização e da simplificação realizada em âmbito infralegal, preso a uma lógica de rigoroso ajuste fiscal comprovadamente nefasta onde instituída, o decreto revoga decretos precedentes; revisa outros; consolida flexibilizações temporárias editadas para a pandemia; incorpora proposições legislativas rejeitadas pelo Congresso, como, por exemplo, aspectos da Lei da Liberdade Econômica; e suprime direitos, como é o caso, entre outros, do direito ao repouso semanal, conquista dos trabalhadores que, remontando aos tempos de constituição do próprio capitalismo, busca assegurar condições físicas, higiênicas, sanitárias e psíquicas adequadas ao convívio social dos cidadãos e cidadãs”.
Para Ari Arolaldo, os apoios dessas entidades são importantes pois alguns segmentos do Judiciário e o próprio Ministério Público do Trabalho ( MPT) já perceberam que sem regras trabalhistas não haverá Justiça do Trabalho, e para isso, é preciso conter o autoritarismo do presidente da República.
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