Conhecida por ser uma empresa rápida nas cobranças e execução de cortes, a Enel não teve a mesma agilidade para resolver o problema que ainda afeta milhares de imóveis na capital e Grande São Paulo: a falta de energia, iniciada na sexta-feira (3) e que perdura até esta quarta (8), de acordo com a própria distribuidora.
A situação, no entanto, tem contribuído com as críticas em torno da agenda privatista encampada no estado pelo governador Tarcísio de Freitas (Republicanos), e o prefeito da capital paulista, Ricardo Nunes (MDB). Ambos aceleram, sem nenhum tipo de debate ou consulta pública, projetos de entrega de serviços essenciais a setores da iniciativa privada.
Ainda no sábado (4), mesmo diante do caos na cidade, ocasionado após forte chuva e ventanias de mais de 100 quilômetros/hora, o prefeito Ricardo Nunes (MDB) passou boa parte do tempo em camarotes no UFC São Paulo, no Ginásio do Ibirapuera, e no autódromo de Interlagos, que sediou o GP Brasil de Fórmula 1 no último final de semana. A atitude de Nunes não foi bem recebida pela população, que reclamou nas postagens feitas em rede social pelo mandatário.
A Enel, responsável por gerir a energia no estado, comprou a antiga estatal Eletropaulo em 2018. De origem italiana, a multinacional coleciona problemas por onde passa. No Chile, uma das sedes da empresa foi incendiada por moradores após aumentos na conta de luz. Em São Paulo, desde que assumiu o serviço, a empresa privada reduziu em 36% o número de funcionários, mesmo com aumento de clientes.
Um dos pontos críticos à atual situação envolve justamente o pequeno número de trabalhadores da empresa para resolver os problemas, que vão desde atendimentos telefônicos às equipes de rua para reestabelecimento da energia.
“Literalmente, privatização é sinônimo de apagão. E o grande problema das empresas controladoras dos serviços é que elas se tornaram rentistas. Ou seja, só pensam no lucro. E, com isso, reduzem o número de trabalhadores e o montante de investimentos preventivos”, alerta Carlos Alberto Alves, presidente do Sindicato dos Trabalhadores Energéticos do Estado de São Paulo (Sinergia-CUT), que enumera também a alta rotatividade e a baixa qualificação de funcionários em setores importantes do serviço.
O dirigente está em Brasília (DF) cobrando dos órgãos públicos e agências reguladoras para que haja cobrança por compromissos sociais das concessionárias de energia, como a universalização e a equidade do serviço e o fim da pobreza energética. Cerca de 20 concessionárias e distribuidoras de energia elétrica terão seus contratos vencidos agora, em novembro. “Estamos fazendo uma luta junto aos órgãos que cuidam desse processo para que se coloque, no contrato com as empresas, o mínimo de compromisso com o fomento e o desenvolvimento do país e com a sociedade”, diz Carlos.
Mesmo com todo esse cenário, na última segunda (6), o governador Tarcísio saiu em defesa da privatização de empresas como a Sabesp, afirmando que não fará contrato “frouxo” com quem assumir a prestação do serviço, deixando claras as obrigações contratuais em situações como a do fim de semana.
Tarcísio é grande entusiasta da agenda de entrega das estatais aos empresários. Tão logo assumiu a gestão, o governador colocou como prioridades a venda do Metrô, da CPTM e da Sabesp, bem como ampliou a terceirização de serviços na saúde e até na educação.
Com (muito) dinheiro público, encomendou estudos que irão confirmar que a privatização fará bem ao estado. Sem licitação, de acordo com o jornal Folha de S. Paulo, somente um dos serviços de assessoria e consultoria custou R$ 71,2 milhões.
Já na capital paulista, o prefeito Nunes também tem acelerado ações para a entrega dos bens públicos aos empresários. Dando continuidade à gestão do PSDB, quando assumiu após a morte de Bruno Covas, o prefeito faz parte do projeto que já entregou cemitérios, mercados municipais, o estádio do Pacaembu e parques. Nos cemitérios, por exemplo, o resultado já é sentido por todos que acessam o serviço: aumento nos preços, falta de manutenção e segurança e muito lixo acumulado nos locais.
Em relação à crise no fornecimento de energia, Ricardo Nunes sugeriu na segunda (6) a criação de uma nova taxa para realizar o aterramento dos fios pela cidade, isentando a Enel desse compromisso.
CUT impede a audiência “surpresa”
Movimentos sociais e sindical, como a CUT, estão mobilizados em todo o estado dialogando com a população sobre os riscos de privatização, que irão encarecer e precarizar os serviços. As entidades cobram do governo estadual transparência, participação e consulta popular sobre as propostas de privatização das estatais.
Na Alesp (Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo), uma audiência pública sobre a venda Sabesp estava programada para ocorrer na segunda (6). Mas como o evento foi marcado de última hora, em meio ao feriado de Finados, a vice-presidenta da CUT-SP, Ivone Silva, a presidenta do Sindicato dos Bancários de São Paulo, Osasco e Região, Neiva Ribeiro, e o deputado estadual Luiz Claudio Marcolino (PT) ajuizaram ação popular pela suspensão da audiência, que foi acatada em liminar concedida pelo juiz Raphael Augusto Cunha.
“Temos um plebiscito popular que está colhendo a opinião da população sobre a privatização da Sabesp, Metrô e CPTM. Sabemos as consequências de uma privatização, a população de São Paulo está sofrendo, após três dias, com mais de 500 mil imóveis sem luz, após privatização da Enel”, destacou Ivone Silva sobre essa vitória.
O plebiscito citado pela dirigente foi encerrado no dia 5, no domingo, e questionava o desejo dos moradores de São Paulo sobre as propostas de venda das empresas públicas. A CUT-SP mobilizou sindicatos e subsedes na coleta de votos tanto nos locais de trabalho, em feiras e terminais de transporte público. O resultado do plebiscito está sendo contabilizado desde terça (7) e será divulgado ainda nesta semana.
“O final dessa campanha do plebiscito acontece em meio a um fato que comprova que a privatização não é boa. Famílias e comércios foram prejudicados com a falta de energia e o descaso da empresa em solucionar rapidamente o problema. É só mais um exemplo que mostra o porquê devemos ser contra a privatização da Sabesp, do Metrô e da CPTM”, afirma Osvaldo Bezerra, o Pipoca, secretário de Mobilização da CUT-SP.
Além dessas ações, também uma nova greve está prevista, como a que foi realizada no início de outubro, mas com a adesão de novas categorias e sindicatos. Além dos trabalhadores do Metrô, da CPTM e Sabesp, os professores estaduais e funcionários da Fundação Casa prometem intensificar a luta.
Redação da CUT