sexta-feira, novembro 22, 2024

Prevenção ao HIV: o papel da saúde pública e a luta contra o preconceito

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O dia 1° de Dezembro, Dia Mundial de Prevenção e Combate ao HIV/Aids, é uma data celebrada todos os anos desde 1988. “Pessoas em todo o mundo se unem para mostrar apoio às pessoas que vivem com HIV e para lembrar quem se foi por doenças relacionadas à AIDS”, diz a apresentação do Unaids, programa da Organização das Nações Unidas (ONU). A cada ano, agências da ONU, governos e sociedade civil se unem para fazer campanhas em torno de temas específicos relacionados ao HIV, com atividades de conscientização e mobilização para arrecadação de fundos ao redor do mundo.

 

A CUT, este ano, concentra sua mobilização, entre outras ações ao combate à violência contra a mulher, fator que é determinante para a infecção pelo vírus em mulheres e meninas. Vítimas de violência sexual, elas se tornam mais vulneráveis ao HIV.

 

A fita vermelha é símbolo universal de conscientização, apoio e solidariedade com as pessoas que vivem com HIV e uma forte simbologia para que este grupo de pessoas se façam ouvidas sobre questões importantes sobre suas vidas.

No Brasil, de 1980 até junho de 2022, segundo dados do Boletim Epidemiológico HIV/Aids do Ministério da Saúde, foram detectados 1.088.536 casos de aids.

Atualmente, cerca de um milhão de pessoas vivem com HIV no Brasil, sendo 650 mil homens e 350 mil mulheres.

Por aqui, a data, que dá início ao Dezembro Vermelho, reforça ainda mais a importância do Sistema Único de Saúde (SUS) no combate à doença. Foi o SUS que garantiu do acesso integral e gratuito aos medicamentos para tratar os pacientes, fez campanhas de enfretamento, testagem rápida e gratuita e dezenas de outras ações, que contribuíram para reduzir taxa de transmissão e mortalidade ao longo dos anos.

Em entrevista ao Portal CUT, em 2020, o ministro das Relações Institucionais, ex-ministro da Saúde e médico infectologista, Alexandre Padilha, um dos responsáveis pela ampliação da rede de acolhimento aos portadores do HIV, afirmou que o número de infectados seria muito maior do que os atuais se a rede pública não oferecesse o tratamento

“A situação hoje poderia ser mais grave. Tivemos êxito na política de enfrentamento ao HIV no Brasil, ampliada durante os governos Lula e Dilma, que reforçaram a importância do SUS e são reconhecidas internacionalmente”, disse Padilha.

Ele afirmou ainda que se não fosse o SUS, mais de 90% dos brasileiros que vivem com o HIV não teriam a menor condição de bancar o tratamento. “Mais de 90% não teriam tido acesso sequer à testagem do HIV/Aids”, disse Padilha.

Em 2013, o Brasil chegou à vanguarda mundial na resposta à AIDS por ter adotado a estratégia de ampliar o acesso ao tratamento da forma mais rápida possível e isso fez com que o país pudesse reduzir o número de mortes causadas pelo vírus.

PREP

Uma das formas de se prevenir contra o HIV é fazendo uso da  Profilaxia Pré-Exposição no Brasil, a PrEP, método que consiste em tomar comprimidos antes da relação sexual, que permitem ao organismo estar preparado para enfrentar um possível contato com o HIV. A pessoa em PrEP realiza acompanhamento regular de saúde, com testagem para o HIV e outras infecções sexualmente transmissíveis.

De acordo com o Ministério da Saúde, entre os avanços conquistados no primeiro semestre de 2023, também está a disponibilização da profilaxia nos ambulatórios que acompanham a saúde de pessoas trans. Em todos os estados há serviços de saúde ofertando a PrEP.

De acordo com o boletim epidemiológico, a Profilaxia Pré-Exposição é mais acessada pela população branca (55,6%), em comparação com as pessoas pardas (31,4%), pretas (12,6%) e indígenas (0,4%), dado que reforça a importância do detalhamento dos registros no SUS e a necessidade de ampliação de acesso para pessoas pretas e pardas.

Nesse contexto, a pasta garantiu que 5.533 novos usuários entrassem em PrEP até outubro de 2023, 77% a mais do que em outubro de 2022. Com isso, 73.537 usuários estão em PrEP atualmente, o que representa aumento de 45% comparado com o ano anterior. Entre os usuários de PrEP em 2023, há somente 12,6% de população preta, 3,3% de mulheres transexuais, 2% de homens trans, 0,4% de população indígena e 0,3% de travestis.

Informação que salva vidas

Ao Portal CUT, o psicólogo Eduardo Oliveira, do Projeto Demonstrativo PrEP1519, e integrante de grupo de ativistas que atua nas redes sociais com o nome de Doutor Maravilha (@doutormaravilha no Instagram), para orientar, acolher e desconstruir preconceitos contra pessoas que vivem com o vírus, afirmou que não existe um rosto para o HIV.

“O HIV pode acontecer com qualquer pessoa, independe da classe, cor, expressão ou identidade de gênero”, diz Eduardo, que também atua em um Centro de Testagem e Aconselhamento (CTA) na cidade de São Paulo.

De acordo com ele, é importante que toda a sociedade tenha consciência sobre isso para que grupos sociais, como os heterossexuais, não se sintam “imunes” ao vírus. “Lá nos anos 1980, quando apareceu o HIV, havia a ideia muito forte de que existiam grupos sociais disseminadores [os gays] e a concepção de peste gaycastigo divino e a gente vem combatendo essa ideia porque ela afasta esses grupos, como os heterossexuais, de acharem que podem se infectar”, diz o psicólogo.

O conceito principal, portanto, é de que ninguém está imune e os métodos de prevenção têm de ser praticados por todos e todas.

Mas há casos que fogem à prevenção individual, por livre arbítrio. Exemplo, os casos que envolvem violência. A Secretária da Mulher Trabalhadora da CUT, Amanda Corcino, reforça, nesse aspecto, que é preciso a sociedade também ter consciência de que as mulheres estão suscetíveis à infecção e com o agravante de serem vítimas de violência.

O 1° de Dezembro faz parte do calendário de lutas da campanha da Organização das Nações Unidas (ONU), que tem participação da CUT, 21 Dias de Ativismo pelo Fim da Violência Contra a Mulher,

Profissionais de saúde vêm reforçando ao longo dos anos a ideia de que o HIV pode – e está – em qualquer grupo social e levar informação à sociedade sobre prevenção, tratamento e para acabar com estigmas acerca da doença é o principal instrumento de luta contra o HIV. Mas Eduardo diz também que a informação não pode se restringir aos serviços de saúde e precisa ganhar espaços como a escola e o trabalho. “Isso pode ajudar pessoas saberem que é possível viver com o HIV”, diz o psicólogo.

Estigmas e preconceito

Um dos principais objetivos das campanhas realizadas durante o Dezembro Vermelho é justamente o combate ao preconceito. Quem vive com o HIV sabe a dor que sente. E, muitas vezes, o medo de ficar estigmatizado, sofrer preconceito faz com que a pessoas não vá fazer o teste por medo ser positivo e ser visto pela família, pelos amigos, pelos colegas de trabalho como alguém a ser evitado.

Por isso acabar com o preconceito e garantir acesso ao tratamento e aos cuidados são fatores fundamentais para o enfrentamento ao vírus.

Indetectável = Intransmissível (I=I)

Quando a pessoa vivendo com HIV faz o uso correto dos medicamentos antirretrovirais, é muito provável que ela consiga o controle do HIV. Isso é medido regularmente pelo exame de carga viral, cujo resultado expressa a quantidade de vírus presente no sangue. Estima-se que, após seis meses do início do tratamento antirretroviral (TARV) adequado, o exame de carga viral tenha seu resultado “indetectável”.

O resultado indetectável quer dizer que não foi possível encontrar vírus naquela amostra de sangue. No entanto, as evidências científicas obtidas a partir de estudos que incluíram vários países, comprovaram que não há risco de transmissão do HIV por via sexual para as pessoas com adequada adesão aos antirretrovirais e com carga viral indetectável por pelo menos seis meses.

Significa, em outras palavras que a quantidade de cópias do vírus por mililtro de sangue é tão ínfima de modo que o HIV se torna intransmissível por vias sexuais.

De acordo com a Unaids, “a consciência de que o HIV não mais pode ser transmitido sexualmente pode dar a essas pessoas com carga viral indetectável um forte senso de que elas são agentes de prevenção em sua abordagem perante relacionamentos novos ou já existentes“.

Peguei, e agora?

O psicólogo Eduardo Oliveira, contou ao Portal CUT, em 2020, durante entrevista especial, que cada pessoa lida de uma forma diferente ao saber o resultado do exame.

“Alguns manifestam tristeza, o medo aparece com mais frequência, a culpa e até medo da morte. Cada um dá um sentido e o que contribui é justamente a questão social onde pouco se fala sobre o HIV e quando se fala é numa perspectiva ruim ou negativa”, ele disse, reforçando a necessidade diálogo social sobre o tema.

Por isso, a hora de comunicar o resultado, de acordo com o psicólogo, é um momento crucial. “O acolhimento na primeira fase precisa ser um momento de bastante cautela, de ouvir a pessoa, saber o que ela pensa sobre o HIV para poder construir um caminho para que ela consiga iniciar e se manter no tratamento”, explicou o profissional.

Mas o acolhimento nas outras fases também é importante. “Mesmo depois de iniciado o tratamento reflexões mais profundas podem acontecer a qualquer momento. São as situações em que a pessoa que vive com HIV precisa decidir sobre falar do HIV com o namorado, a namorada, a família e em outras situações. Por isso, acolhimento e acompanhamento psicológico, também gratuitos pelo SUS, são importantes em todas as fases”, ele reforçou.

Lei garante proteção contra o preconceito

De autoria da ex-senadora Serys Slhessarenko (PT-MT), a Lei 12.894, que criminaliza o preconceito contra pessoas com HIV, foi sancionada pela presidenta Dilma Rousseff em 2014.

De acordo com a legislação, é crime punível com reclusão de um a quatro anos, além de multa, recusar, cancelar ou segregar alunos em estabelecimentos de ensino; negar emprego ou trabalho ou demitir trabalhadores; segregar em ambiente de trabalho ou escolar; recusar atendimento de saúde e, em especial, “divulgar a condição do portador do HIV ou de doente de aids, com intuito de ofender-lhe a dignidade”.

Em caso de violação de qualquer direito, a recomendação é fazer um Boletim de Ocorrência (BO) na delegacia mais próxima e entrar com ação criminal.

Sigilo no trabalho e Sigilo médico

A pessoa com HIV tem o direito de manter em sigilo a sua condição sorológica no ambiente de trabalho. Isso inclui testes de admissão, testes periódicos ou de demissão. O médico tem a obrigação de somente averiguar a capacidade laborativa do trabalhador nos exames legais, sem referência ao estado sorológico. É o que diz o Art.168 da CLT.

Em caso de violação, deve-se registrar o ocorrido na Delegacia do Trabalho mais próxima.

Redação da CUT

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