Embora sejam a maioria em muitas categorias, poucas são as mulheres negras que conseguem compor a direção de um sindicato
Os negros correspondem a 48% dos trabalhadores e trabalhadoras de todo o país, porém recebem por sua labuta 63,9% do que recebem os não negros. As desvantagens aumentam de acordo com a região em que se está ou do setor de atividade da economia em que se atua. As diferenças salariais são ainda maiores quando observamos os rendimentos das mulheres negras.
Os dados das regiões metropolitanas da PED/DIEESE apontam que os trabalhadores e as trabalhadoras negras ocupam os cargos de menor prestígio e valorização. Em São Paulo, na maior metrópole do país, apenas 3,7% dos negros alcançam cargos de direção e planejamento, enquanto o percentual para os demais trabalhadores é de 18,1%.
No meio sindical, essa realidade ganha novas nuances e mostra-se diferente. A Pesquisa Perfil dos Dirigentes Sindicais CUTistas, realizada em 2014, demostra que na Central Única dos Trabalhadores (CUT) a proporção de negros entre os dirigentes entrevistados é de 65%. Os negros ocupam diversas secretarias de instância da Central. Em todo o país a representatividade deles é de 71% dos presidentes, 70% dos secretários gerais, 91% dos secretários de combate ao racismo, além de serem 74% nas pastas da juventude e 72% nas secretarias de mulheres.
Embora a participação dos negros no meio sindical seja bem efetiva, essa realidade muda quando falamos especificamente das mulheres negras. No mercado de trabalho, a maioria dessas mulheres concentram-se nas ocupações de menor prestígio e valorização. Faltam oportunidades para ocupar cargos de destaque e as exigências para contratações por vezes as excluem de muitos setores.
O ramo do comércio e serviços é um dos que mais contam com a atuação das mulheres negras. Segundo dados do Dieese, elas representam 7,8% do setor hoteleiro, 17,9% do setor do comércio e 17,9% do setor de serviços. Porém, apesar dos números e da representatividade nesses ramos, poucas são as que atuam no movimento sindical.
“Existem pouquíssimas mulheres negras no meu sindicato e observo o mesmo em sindicatos de diferentes regiões. Muitas não participam devido ao desconhecimento, não tem oportunidade. Outras foram tão oprimidas durante toda a vida que pensam que não tem capacidade e não podem lutar por seus direitos” relata a secretária de Política de Promoção para Igualdade Racial da Contracs, Ana Lúcia, que pertence ao setor de serviços.
Para a comerciária representante do Conselho Fiscal da Contracs, Raimunda Soares da Costa, o racismo ainda tão presente no mercado de trabalho é o que faz com que e as mulheres negras se afastem do meio sindical. “A mulher negra continua vivendo uma situação marcada pela dupla discriminação: ser mulher em uma sociedade machista e ser negra numa sociedade racista. Isso faz com que elas se afastem de situações de confronto político e de interesses, por isso, vemos tão poucas dirigentes sindicais negras”.
A secretária de mulheres da Contracs, Paloma dos Santos, também aponta o machismo como um dos grandes opressores da atuação das mulheres negras no movimento sindical. “Embora as mulheres tenham conquistado seu espaço no movimento sindical, muitas ainda enfrentam questões que as impedem de participar e atuar como dirigentes. A falta de creches para os filhos, companheiros e maridos que não as deixam atuar e o machismo dentro dos sindicatos são as principais causas”.
Paloma acrescenta que em muitos sindicatos é comum ver a participação das mulheres apenas em pastas de gênero. “Tem diretoria de sindicato que não tem pasta racial e nem mulheres negras em sua composição. Muitas vezes em encontros sindicais de diferentes setores, me vi sendo a única mulher negra. Isso demostra claramente a falta de oportunidade presente em todos os meios de nossa sociedade”.
A diretora da Contracs Luiza Batista, da categoria das domésticas vê com otimismo as mudanças ocorridas no movimento sindical nos últimos anos. Para ela, a participação das mulheres avançou muito e está mais ampla, principalmente por conta da paridade implantada na CUT. “A paridade é resultado de muita luta, pela primeira vez temos igualdade entre homens e mulheres na diretoria de nossa Central, mas ainda temos muito no que avançar”.
Para Luiza, entre os avanços necessários está uma maior atuação das mulheres negras no meio sindical. Ela afirma que a atuação delas nos espaços de poder ainda e mínima. “A falta de oportunidade é a grande causa. Precisamos incentivar a participação das mulheres negras desde cedo, fazendo com que elas integrem movimentos estudantis. Assim elas podem lutar contra o preconceito do mercado de trabalho, por mais chances nos cursos de profissionalização e ensino superior. E assim, desde novas vão sendo empoderadas e sentem-se confiantes para lutar e atuar em qualquer meio”.
A conselheira Raimunda Soares ressalta que o movimento sindical também tem que fornecer apoio e incentivar as mulheres negras. “Com organização do coletivo de mulheres e do racial é possível trabalhar a autoestima, a segurança e incentivar essas mulheres que compões a nossa base a participar e atuar no meio sindical. Cabe a nós realizarmos a mudança que queremos por meio de políticas afirmativas e de valorização das categorias. Temos que seguir com a campanha Basta de Racismo e fornecer meios efetivos para que ele acabe e as mulheres adquiram espaço”.