Evento debateu as consequências do golpe para a população negra, mercado de trabalho e políticas afirmativas
No auditório do Centro de Formação e Lazer, em Mongaguá (SP), a Confederação Nacional dos Trabalhadores no Comércio e Serviços da CUT (Contracs/CUT) realiza o II Encontro Nacional de Promoção de Igualdade Racial com cartazes que denunciam a realidade do povo negro: racismo, desigualdades e violência.
A abertura do evento contou com a secretária de mulheres da Contracs Paloma dos Santos, o secretário de saúde e segurança do trabalhador Domingos Braga Mota, a coordenadora da CUT-Baixada santista Anuska Schneider e o membro do coletivo racial da Contracs Octaciano Neto.
“O Brasil é um país racista e excludente e não podemos deixar isto acontecer. As pessoas estão morrendo, estamos sendo excluídos do mercado de trabalho e precisamos abrir os olhos e enfrentar esses problemas.” apontou Paloma.
Golpe e racismo
Para tratar da conjuntura, João Roberto de Jesus Filho abordou os retrocessos que são consequências diretas do golpe institucional, que impeachmou a presidenta Dilma Rousseff.
O vice-presidente do Conselho de Igualdade Racial de Cubatão comparou o golpe de 1964 com o de 2016. Segundo ele, os golpes tiveram os mesmos moldes, sendo que em 2016 foi mais moderno e ainda repetiu o golpe como aconteceu recentemente em Honduras e no Paraguai.
João Roberto reiterou as conquistas dos últimos anos, como o reconhecimento do racismo na constituição e a adoção de políticas públicas que beneficiaram majoritariamente a população negra como os programas sociais Brasil Quilombola, Pro-Uni, Luz para todos e a instituição da Lei de Cotas.
Entre os retrocessos, o palestrante destacou a revogação da comemoração do 20 de novembro em diversas cidades e estados. Além disso, João Roberto ressaltou que a PEC 55, que congela os investimentos em saúde e educação pública, assim como a reforma do ensino médio afetarão majoritariamente a população negra que também é mais pobre.
“Existe várias formas de combater os retrocessos como nos conselhos de direitos, que vão ser a nossa retomada e também através das campanhas dos sindicatos. Do jeito que está não podemos deixar mais porque estamos perdendo nosso direitos.” afirmou.
Mercado de trabalho e racismo
Regina Camargo, do Dieese, ressaltou que a história da classe trabalhadora brasileira precisa ser contada a partir da escravidão, já que os negros sempre fizeram parte da classe trabalhadora brasileira. “A visão eurocêntrica não corresponde com a história e resistência dos trabalhadores brasileiros porque ela inicia com o trabalho escravo e com o racismo como poder de dominação. Contar a história do capitalismo sem falar do racismo, é contar uma história pela metade.”
Segundo a economista, o racismo é a ideologia que justifica a supremacia de uma raça sobre as outras com a alegação de que algumas raças não tem autonomia para decidir suas próprias vidas e, por isso, é preciso impor sua vontade sobre outros povos. “O neoliberalismo impõe uma razão e uma cultura através de um pensamento único, desrespeitando a identidade, a diversidade e a cultura dos povos.”
Regina lembrou que a desigualdade no mercado de trabalho está atrelado ao preconceito racial e de gênero.
Em relação aos dados, a técnica do Dieese frisou que de modo histórico a população negra é a maioria entre os desempregados em todas as regiões do Brasil. E Regina também relatou que, em momentos de crise, o desemprego entre a população negra também aumenta mais do que entre a população branca.
A economista também pontuou que o trabalho doméstico é exercido, majoritariamente, por mulheres negras e que na conjuntura da crise se vê o aumento do emprego doméstico entre as mulheres que, nos últimos anos, estava decaindo.
As políticas de ações afirmativas e as cotas raciais
Julio Tumbi, da Educafro, explicou que as ações afirmativas são políticas focais que alocam recursos em benefícios de pessoas de grupos discriminados e vitimados pela exclusão sócio-econômico no passado ou presente. Segundo ele, as medidas tem como objetivo combater discriminações étnicas, raciais, religiosas e de gênero, aumentando a participação das minorias no acesso à educação, saúde, emprego, bens materiais, redes de proteção social, etc.
O militante afirmou que as políticas afirmativas servem a um determinado propósito e devem ser usadas por um determinado tempo até que não seja necessário. “As políticas de cotas são juridicamente reconhecida como discriminações positivas baseadas no principio da igualdade material e são um instrumento efetivo de inclusão para a implementação de políticas públicas e um mecanismo real de acesso à educação, mercado de trabalho, dentre outros.”
Após os debates, os participantes assistiram à peça Carolinas, que aborda a vida e obra de Carolina Maria de Jesus, uma das primeiras escritoras negras brasileiras.