sábado, novembro 9, 2024

Plataformas digitais têm condições de trabalho injustas, diz estudo

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A maioria das pessoas que prestam serviços em plataformas digitais no Brasil enfrenta condições de trabalho injustas e falta de proteção social. A conclusão é do relatório Fairwork Brasil de 2023, lançado nesta terça-feira (25), que avaliou e classificou as condições de trabalho em dez plataformas digitais.

“Os principais resultados da pesquisa mostram que há muito mais continuidades e permanências do que mudanças na economia de plataformas no Brasil. De um lado, [a pesquisa] mostra, em primeiro lugar, uma plataforma local nascida há dois anos. De outro, mostra que há muita coisa a se fazer em termos de trabalho decente na economia de plataformas no Brasil”, disse Rafael Grohmann, professor de estudos críticos de plataformas da Universidade de Toronto e um dos coordenadores da pesquisa no Brasil.

As classificações são baseadas em cinco princípios que as plataformas digitais de trabalho têm que garantir para que se considere que oferecem padrões mínimos básicos de justiça: remuneração, condições, contrato, gestão e representação. As dez empresas avaliadas no Brasil foram 99, Americanas Entrega Flash, AppJusto, GetNinjas, iFood, Lalamove, Loggi, Parafuzo, Rappi e Uber.

As pontuações atribuídas às plataformas abrangem o período de julho de 2022 a julho de 2023. Quanto mais baixa a pontuação, mais longe está a empresa do cumprimento dos princípios avaliados. A maioria das plataformas não pontuou em nenhum princípio.

Apenas três das dez plataformas tiveram ao menos 1 ponto – AppJusto, iFood e Parafuzo. A AppJusto lidera a tabela com 3 pontos, seguida pela iFood, com 2 pontos e pela Parafuzo, com 1 ponto. As empresas restantes zeraram na pontuação. De acordo com o relatório, a baixa pontuação das empresas demonstra que muitas mudanças ainda precisam ser feitas.

Para Rafael Grohmann, as políticas públicas e o contexto de regulação no trabalho do plataformas devem levar em conta os cinco princípios de trabalho decente.

“Ainda estamos no processo de aceleração nessa ‘plataformização’ do trabalho em cenário brasileiro. Em termos de soluções, é preciso uma regulação do trabalho para plataformas que seja forte e que tenha os princípios de trabalho decente como base, e não somente focar em um ou outro aspecto, assim como construir alternativas para as plataformas já existentes. Alternativas comunitárias, locais, cooperativas”, disse.

Grohmann citou exemplo avaliado pelo Fairwork no Equador, plataforma cooperativa de trabalho doméstico que pontuou 8 de 10. “[Isso] mostra como outros modelos de plataformas são também possíveis”, afirmou.

Pontuações

Nenhuma empresa pontuou no quesito sobre condições justas de trabalho, o que significa que não houve evidências suficientes de que as dez plataformas cumprem tal princípio.

“Embora algumas mudanças estejam em andamento pelas plataformas, elas não foram capazes de demonstrar de forma efetiva o fornecimento de equipamentos e treinamentos adequados para proteger a saúde e segurança de todos os trabalhadores”, diz o relatório. Além disso, a conclusão é que não houve evidências claras de que as plataformas projetam processos considerando a segurança e a saúde ocupacional.

Outro critério em que nenhuma empresa pontuou foi representação justa, já que não houve evidências de que as plataformas asseguram a liberdade de associação e a expressão da voz do trabalhador. Também não houve evidências de que as plataformas realmente apoiam a governança democrática, conforme o relatório.

Apenas duas plataformas – AppJusto e Parafuzo – conseguiram um ponto no quesito remuneração justa, o que significa que elas garantem que todos os trabalhadores ganham pelo menos o salário mínimo, que é de R$ 6 por hora, e que todos os pagamentos são feitos pontualmente e de forma integral.

As demais empresas avaliadas ficaram com zero nesse quesito, ou seja, não oferecem remuneração justa aos trabalhadores. Se considerado o salário mínimo ideal de R$ 30,22 por hora, de acordo com o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), a pesquisa revela que as dez plataformas não atingem o valor.

Na questão de contratos justos, as plataformas AppJusto e iFood conseguiram 1 ponto cada, a partir de evidências de que têm termos e condições claros, transparentes e acessíveis. No entanto, não houve evidências de que as 10 plataformas conseguem garantir que nenhuma cláusula injusta tenha sido incluída nos contratos.

Para o princípio gestão justa, as plataformas AppJusto e iFood conseguiram 1 ponto cada, com evidências de que há um sistema eficaz para o devido processo de decisões que afetam trabalhadores, o que implica que existe um processo documentado para os trabalhadores recorrerem significativamente de pontuações baixas, penalidades e outras ações disciplinares. No entanto, a pesquisa não conseguiu evidências de que as 10 plataformas proporcionam igualdade no processo de gestão.

O projeto Fairwork é coordenado pelo Oxford Internet Institute e pelo WZB Berlin Social Science Center. A rede de pesquisadores atualmente avalia plataformas em 38 países em 5 continentes.

Uber

Segundo a Uber, a metodologia tem falhas que comprometem os resultados e impedem que a iniciativa seja usada na construção de melhorias aos maiores interessados: quem usa aplicativos para trabalhar”. Em nota, a plataforma diz que não participou do relatório e apresentou seus problemas há mais de seis meses, quando foi convidada por representantes do Fairwork Brasil a colaborar com a iniciativa.

“Como reconhece em posicionamento público, a Uber acredita que é preciso avançar em mecanismos que melhorem a proteção social dos trabalhadores de aplicativo para que esses profissionais independentes possam exercer plenamente sua atividade. Nos últimos anos, em diálogo constante com motoristas parceiros, a Uber vem implementando medidas nessa direção, embora saibamos que ainda há muito o que avançar”, diz a nota.

Redação da CUT

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