segunda-feira, outubro 7, 2024

Mulheres de Roraima lutam contra violência no estado com maior taxa de estupro por habitante

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Roraima ocupa o primeiro lugar no ranking nacional de estupros em geral e estupros de vulnerável por habitantes. De acordo com dados do 17° Anuário de Segurança Pública, o estado teve registros de 726 casos no ano de 2022, 24,3% a mais que o Acre, estado que aparece na segunda posição na estudo.

Foi partindo desse atual e alarmante cenário que a professora e pesquisadora Luziene Parnaíba, da Universidade Federal de Roraima (UFRR), e outras pesquisadoras da instituição tiveram a iniciativa de criar o programa de extensão Observatório da Violência contra a Mulher em Roraima (Observatório VCM). Esse programa tem como objetivo monitorar e investigar as diversas violências praticadas contra as mulheres, além de produzir indicadores da violência e fornecer dados para possíveis pesquisas sobre discriminações de gênero no estado.

O programa de extensão possui uma abordagem interseccional, atendendo mulheres em diversas situações sociais a partir de quatro eixos: violência doméstica e feminicídio; feminização das migrações e tráfico de mulheres; violência obstétrica; e mulheres, garimpo e meio ambiente.

De acordo com Luziene Parnaíba, essa é apenas uma das razões pelas quais a criação de organizações em Roraima, que atuam para combater as consequências de um sistema patriarcal excludente, é de extrema importância.

“Estamos lidando com um dos estados mais afetados pela violência contra a mulher em todo o país. Roraima foi o território que registrou o maior número de ocorrências relativas a homicídios de mulheres e violência psicológica, com mais de 3 mil casos, de acordo com dados do Anuário de Segurança Pública (2021)”, destaca a pesquisadora.

Organizações feministas em Roraima

Diante dessa realidade, os coletivos de mulheres em Roraima têm sido fundamentais ao atuarem principalmente na criação de estratégias e mobilizações que assegurem ações de cunho preventivo à violência de gênero.

Além de também gerenciarem debates sobre as desigualdades de gênero, para desmistificar a ideologia que perpetua essa violência, os grupos feministas do estado lutam por direitos sexuais e reprodutivos, promovendo conversas e conscientização sobre esses direitos fundamentais para a autonomia e o bem-estar das mulheres.

Fruto da luta feminina em Roraima, o Núcleo de Mulheres em Roraima (Numur) foi fundado em 8 de março de 1998, constituindo uma das principais organizações feministas no estado, tendo como missão cobrar políticas públicas que inibem a desigualdade de gênero. O dia que marcou sua criação reuniu mulheres de diversas etnias e origens; entre elas, indígenas, negras, sindicalistas e acadêmicas.

O núcleo criou recentemente o IVA – Instituto Vidas Amazônicas: Gênero, Democracia e Justiça Socioambiental. “Por meio desse espaço, vamos trabalhar com linhas que contemplem mulheres e meio ambiente de forma mais sistematizada e permanente. No atual governo, com a reestruturação do Ministério das Mulheres, há iniciativas que buscam mais equidade e a implementação de políticas públicas para as mulheres, pontua a socióloga Andrea Freitas, integrante do Numur.

O Numur é um dos agrupamentos pertencentes a Articulação de Mulheres Brasileiras (AMB), com seu caráter antirracista, antipatriarcal e anticapitalista, e procura estabelecer diálogos e exercer projetos em colaboração com outros coletivos feministas de Roraima, preservando a construção de um feminismo popular.

Movimento feminista indígena

A institucionalização da Secretaria de Movimento de Mulheres Indígenas, do Conselho Indígena de Roraima (CIR), foi a primeira conquista do feminismo indígena no estado. Em seguida, a partir das lutas oriundas dessas mulheres, foi criada em 1999 a Organização das Mulheres Indígenas de Roraima (Omir), que também contou com a participação efetiva do (Numur) para sua articulação.

Na avaliação da coordenadora geral da Omir, Norma Tavares, “o papel que a organização vem desenvolvendo com as coordenadoras regionais e locais é fundamental por desenvolver ações na linha específica voltada para a proteção e promoção dos direitos das mulheres indígenas no contexto das políticas públicas. A Omir, em suas ações, foca no fortalecimento do protagonismo e nas incidências nos movimentos indígenas e com isso traz  temáticas através de palestras e oficinas como discriminação e violência contra mulheres indígenas, alcoolismo e outros”.

Desafios enfrentados pelo movimento

Ranielly Soares, coordenadora do Movimento Mulheres Camponesas (MMC) em Roraima, pontua que o movimento no estado está passando por um processo de reconstrução. “É muito difícil, pois estamos em um estado fascista, que dificulta a mobilização e a construção.

Mesmo assim, o Movimento das Mulheres do Campo (MMC), atuante há 40 anos, “conseguiu que uma das principais conquistas durante esses anos de atuação seja a contribuição na qualidade de vida para nós, mulheres do campo, com a aposentadoria para as trabalhadoras rurais”, relata Ranielly.

Participação da sociedade

Além das organizações especificamente formadas por mulheres para combater o machismo, Roraima também conta com outros movimentos que prestam seu apoio integral à causa, como o próprio Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).

“A luta do feminismo no MST é dentro de uma perspectiva de classe. Entendemos o feminismo como uma construção social que se faz necessário emancipar não somente as mulheres, mas a classe trabalhadora de homens e mulheres. Por isso debatemos o feminismo camponês. Defendemos pautas como os direitos políticos e econômico das mulheres, a participação política das mulheres em todos os espaços de decisões, o direito ao aborto legal e seguro, a luta contra o feminicídio”; explica Maria Gerlânia, a Bia, da direção nacional do movimento em Roraima.

Um ponto característico nas entidades envolvidas na causa é justamente mobilizar a participação da população de Roraima e, dessa forma, promover seminários, debates, manifestações e cursos sobre a temática – principalmente quando se trata do dia 8 de março, o dia internacional da mulher.

“Nós, do Numur, ao longo desses 25 anos ressignificamos o 8 de março, que até os anos 2000/2010 era uma data “comemorativa” e de homenagens por parte das instituições e autoridades, porém, o movimento feminista passa a politizar e problematiza a data, trazendo reflexões sobre a condição da mulher na sociedade, sobre o tema da violência e das desigualdades”, lembra a feminista Andrea Freitas.

Para ela, as conquistas do movimento ocorrem no plano objetivo – por meio, por exemplo, de mobilizações que resultam na aprovação de leis mais progressistas –, mas também no plano subjetivo. “Hoje, o velho ditado de que “em briga de marido e mulher não se mete a colher” cair por terra, pois, a sociedade não aceita como antes o fenômeno da violência doméstica”, argumenta Freitas.

Redação: Brasil de Fato

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