Embora recomendada como forma de combate ao desemprego pela OIT, lobby empresarial ainda é principal causa do retrocesso da jornada trabalhista
No Brasil, a luta pela redução da jornada de trabalho está presente no debate sindical desde o início do processo de industrialização, no final do século XIX e começo do século XX. Nesse período, as primeiras greves de trabalhadores já apresentavam a redução da jornada de trabalho como um importante mote de luta.
A jornada de trabalho que conhecemos – composta por oito horas diárias, totalizando 44 horas semanais, com possibilidade de horas extras – foi estabelecida pela Constituição Federal de 1988. Porém, desde a convenção de 1935, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) recomenda a redução da jornada para 40 horas semanais.
O relatório Tendências Mundiais de Emprego 2014 da OIT calcula que em 2018 cerca de 74,5 milhões de jovens, entre 15 e 24 anos, estarão desempregados. A estimativa é de que o desemprego deve atingir em torno de 215
milhões de pessoas de todo o mundo.
Segundo o Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Econômicos (Dieese), o desemprego tem assumido caráter estrutural à medida que mantém mais pessoas, por mais tempo, na situação de desemprego. Essa situação traz a necessidade de que providências sejam tomadas para enfrentar as consequências sociais, econômicas e políticas. Como a redução da jornada de trabalho, sem a diminuição do salário e com o corte nas horas extras, que possibilitam a ampliação do quadro de funcionários e geram empregos.
Economias famosas pelo custo barato de mão de obra, como China e Indonésia, bem como a grande potência mundial EUA, adotaram as 40 horas recomendadas pela OIT. Na Itália, a jornada de trabalho varia de 36 a 40 horas, na Alemanha trabalha-se em média 38 horas por semana. Enquanto na França e na Espanha a jornada é de 35 horas.
No Brasil, o assunto tramita na Câmara dos Deputados desde 1995, por meio da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 231, do ex-senador Inácio Arruda (PCdoB-CE) e do senador Paulo Paim (PT-RS), que propõe a
redução da carga horária máxima semanal de 44 para 40 horas e aumenta o valor da hora extra de 50% para 75%.
O senador Paulo Paim afirma que os argumentos para que a redução da jornada não seja aprovada são os mesmos há 10 anos. “Os empresários fazem uso de lobby na Câmara e argumentam que a redução da jornada aumenta os gastos e consequentemente o custo de vida”.
Para Paim, negociar a redução da jornada de maneira gradativa, até alcançar às 40 horas, é uma opção para tentar vencer o lobby. “O sistema sindical deveria propor a redução de uma hora por ano. Essa seria uma forma de amenizar a pressão e conquistar gradativamente o objetivo almejado”.
“A redução da jornada de trabalho afeta diretamente a saúde e qualidade de vida do trabalhador que, por estar mais descansado, consequentemente fica mais disposto e aumenta a produtividade”, afirma o secretário de finanças da CUT Nacional, Quintino Severo, ao argumentar que o impacto da redução da jornada de trabalho no bolso do empregador seria menos de 1%, “um custo insignificante”, complementa.
O economista Marcio Pochmann vê a redução da jornada de trabalho, sem a diminuição de salário, como algo positivo. Segundo Pochmann, desde que se mantenha o ritmo da produção, o ganho da produtividade será suficiente para cobrir os gastos salariais e não irá impactar na economia.
Ele explica que outra opção seria criar mais empregos, para que a produtividade fosse mantida, ampliando assim o consumo e compensando a hora trabalhada. “Os empresários preferem utilizar a hora extra por não saberem se haverá consumo para o produto. Por isso, para reduzir a jornada é preciso que haja ganho de produtividade combinado com crescimento econômico”, pontua. Segundo o Dieese, o trabalhador tem pouco tempo livre, uma vez que realiza hora extra ao longo da semana, ocupa tempo no deslocamento/transporte entre casa e trabalho, precisa fazer cursos e atividades de qualificação que raramente são remuneradas como tempo de trabalho e por vezes realizam outros trabalhos em tempo parcial, como autônomos ou trabalhos domésticos. Com todos esses elementos, o tempo gasto com atividades relacionadas ao trabalho é bem superior à jornada legal de 44 horas semanais.
Comerciários
Trabalhar aos domingos e feriados e permanecer no estabelecimento além do horário para bater metas de vendas, organizar mercadorias e garantir renda são características das atividades dos trabalhadores/as do comércio que estão sujeitos às vontades dos patrões e diariamente excedem a jornada de trabalho. Segundo o Dieese, a jornada média semanal dos comerciários/as é de 49 horas, número que ultrapassa e muito a jornada legal vigente de 44 horas semanais.
As jornadas extensas muitas vezes têm as horas extras convertidas em banco de horas. Em alguns locais, os trabalhadores podem escolher entre acumular horas ou receber as horas extras. A Confederação Nacional dos Trabalhadores no Comércio e Serviços (Contracs/ CUT) entende que o banco de horas é prejudicial aos trabalhadores, principalmente por atender unicamente às necessidades dos patrões, tanto no momento em que se acumulam as horas como no momento mais conveniente que devem ser utilizadas pelo trabalhador.
A Contracs defende a redução da jornada de trabalho para 40 horas semanais, sem a redução de salário. E associa a redução de quatro horas de trabalho a mais tempo para o comerciário estar ao lado da família, se divertir, estudar, ou simplesmente descansar.