quinta-feira, outubro 10, 2024

Já enfrentamos a ditadura, o momento é de unidade para apontar caminhos, diz presidente da Contracs

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Em maio, a direção da Confederação dos Trabalhadores em Comércio e Serviços (Contracs) irá abrir espaço para um novo grupo de dirigentes que assumirá a árdua tarefa de enfrentar um governo inimigo da classe trabalhadora nos próximos três anos.

O Congresso para eleger a próxima direção acontece em março, mas a posse ocorre dois meses depois tendo pela frente o anseio de muitos empresários de rebaixar direitos apoiados na reforma trabalhista.

Após dois mandatos, Alci Matos Araújo, comerciário do Espírito Santo, deixará o cargo e encerrará uma trajetória que teve início em 2011 e foi do apogeu do diálogo dos movimentos sociais com o Estado durante os governos Lula e Dilma, até o golpe contra a presidenta e a ideia de que o trabalhador deve escolher entre ter direitos ou ter emprego, como prega o eleito Jair Bolsonaro.

Em entrevista ao site da Contracs, Alci faz um balanço dos mandatos e aponta quais as prioridades para a confederação que representa duas das categorias mais prejudicas pela informalidade e a precarização das condições de trabalho.

Para ele, neste momento em que o governo bate cabeça a classe trabalhadora precisa se unificar para apontar caminhos em nome do trabalho digno.

O que a classe trabalhadora aprendeu em 2018 e que pode ajudar na luta em 2019?
Alci Matos – Nós devemos, cada vez mais, nos apropriar das ferramentas de estudo, formação e qualificação para enfrentar e mudar a opinião do Capital e do patronal. O governo vem colocando posição muito dura e um corte drástico nos direitos dos trabalhadores e vamos resistir. Mas essa palavra não tem mais impacto, se dissociada do como. E esse como está ligado ao processo de negociação coletiva. Atente ao termo coletiva porque está ligado à unidade da classe trabalhadora e ao investimento em mais seminários, mais informação e mais capacitação de nossos dirigentes. Dirigentes esses que não podem mais abrir mão de fazer chegar às bases o entendimento de que neste novo período o trabalhador é tratado como inimigo. Basta ver que o salário mínimo ficou abaixo do estimado pelo governo anterior e que uma das primeiras reformas que pretendem fazer é da Previdência, além de ministérios importantes para a classe trabalhadora terem sido cortados.

Temos alguma razão para ter esperança?
Alci Matos – Esse cenário, sem dúvida, é de grande dificuldade, não podemos negar isso, mas lembremos de que o novo sindicalismo foi forjado durante a ditadura, quando havia a prisão de dirigentes sindicais. Não vamos desanimar agora, sabemos da nossa importância na luta em defesa da democracia e sabemos também que agora há táticas diferentes de nos fazer calar como esse terrorismo das redes sociais e da comunicação digital. Mas temos a capacidade de motivar as bases para nos mantermos em defesa de nossos direitos. E não precisamos ir tão longe para mostrar que essa capacidade não acabou como quer fazer crer o novo governo. Em algumas coisas, como a própria reforma da Previdência, o empresário achou que poderia muito mais, mas no ano passado não conseguiu efetivar e virão para cima com tudo agora. Se resistirmos à pressão e assegurarmos o valor da organização da classe trabalhadora vamos conseguir balancear esse cenário. Repito, a negociação coletiva deve ser nosso parâmetro fundamental. Não tem vara de condão, a economia não resolveu e não sabemos ainda para onde vai com o novo governo, o nível de desemprego segue alto, a relação construída com países do Mercosul está abalada e vemos dificuldade em nos relacionar com antigos parceiros. O presidente não se expõe porque parece não saber o que fazer, vemos a equipe econômica bater cabeça com quem foi eleito e este é o momento de nós, classe trabalhadora, afinarmos nosso discurso e entendimento.

Qual você acredita que será uma prioridade do movimento sindical?
Alci Matos – Nós acreditávamos que, ao chegar em 2018, pudéssemos ter novas bandeiras, mas como andamos para trás com este novo governo, a pauta segue sendo a defesa de salário decente, mais do que nunca, aliado ao conceito de trabalho decente. Também acredito que estarão no topo da pauta o conceito de representatividade da classe trabalhadora e a manutenção de conselhos nacionais onde representamos os trabalhadores. Porque se ninguém de nós puder exercer o que prevê a Constituição, o controle social, na aplicação de recursos do SUS (Sistema Único de Saúde), por exemplo, o que esse governo pode fazer com aquilo que é destinado a quem não pode pagar por plano de saúde? A fiscalização do movimento sindical tem de ser muito mais criteriosa do que já foi. Sempre foi premissa nossa dialogar, mas temos de estar atuantes. Temos que voltar com a pauta de valorização do salário mínimo, essa política tem de ser mantida, assim como a luta em defesa dos direitos humanos que norteiam nossa existência.

Neste ano teremos eleições e uma nova direção. Qual o balanço que você faz sobre essas duas gestões?
Alci Matos – Eu sempre busquei ser um motivador, ainda com os comerciários do meu estado, o Espírito Santo, em ter uma entidade que fosse diferente em relação as que se embrenhavam nos modelos corporativos do MTE (Ministério do Trabalho). Com a Contracs nós impulsionamos, ano após ano, de um orçamento que foi crescendo em valores e em movimentação e articulação política, esse processo, num processo planejado. Fomos a vários estados fazer planejamento de sindicato e, antes da deformação trabalhista, tocávamos seminários paralelos de 50 pessoas de Norte a Sul do Brasil. É muito ruim quando o Congresso não entende que mais de 40 milhões dos brasileiros recebem menos de um mínimo e a reforma aprofunda isso. Mas chegamos a um patamar de construção de ideias, que ganha ainda mais importância no nosso Congresso que acontece em março. Novas lutas, nova possibilidade. O mais importante foi o capital humano que formamos, campanhas, estudos, lutas conjuntas, sendo respeitados pelas organizações internacionais como Rel-Uita, ISP, UNI e reconhecidos, inclusive, sendo responsáveis agora pela Unicom, organização dos trabalhadores do comércio e serviços do Mercosul que a Contracs gerencia.

São mais de 14 categorias que debatem e discutem conosco nacionalmente as melhores formas de representação e categorias que vão desde as domésticas até trabalhadores de autoescola. Criamos a setorização da Contracs com essas categorias tendo autonomia e se reunindo para apontar quais são suas demandas num processo que vem de baixo para cima e não o contrário. Criamos a regionalização, onde as regionais se reúnem e falam da política que desejam para sua localidade.

Nossa missão sempre foi negociar e defender os interesses da classe trabalhadora frente aos empresários e ao governo e acredito que fizemos isso bem.

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