sábado, outubro 5, 2024

Fundos de pensão vão atuar para o país voltar a criar emprego e renda

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Os recorrentes ataques do presidente Lula e de membros de sua equipe à alta de juros, na intenção de recolocar o país na rota de crescimento econômico, são manifestações de um governo que vai trabalhar para criar emprego, renda, proteção social e inclusão. Adepto dessa linha, o novo diretor-superintendente da Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc), Ricardo Pena, não tem dúvida de que seu papel à frente da autarquia vinculada ao Ministério da Previdência Social é fomentar o desenvolvimento dos fundos de pensão, resgatar direitos e a proteção dos assistidos, e também articular a atuação do segmento no crescimento econômico do país.

Nesta entrevista exclusiva à jornalista Patrícia Cunegundes, da Associação Nacional dos Participantes de Fundos de Pensão e de Beneficiários de Saúde Suplementar de Autogestão (Anapar), Ricardo Pena desenha seu projeto de gestão à frente da Previc, poucos dias após tomar posse.

Além da retomada do crescimento do setor de previdência complementar fechada, Ricardo Pena elenca seus objetivos e desafios, e fala sobre temas como a mitigação de riscos, investimentos, marco regulatório, entre outros temas de interesse dos participantes e assistidos de fundos de pensão.

“Vai ser um trabalho de todo o sistema, a credibilidade é o nosso produto principal e devemos trabalhar para recuperar o setor de previdência complementar, fazer crescer e aumentar a formação de poupança previdenciária com o objetivo de formar um segundo pilar de proteção social e contribuir para o crescimento econômico do País”, afirma.

Confira a entrevista

Segundo o Relatório Anual da Previc 2010, nos primeiros governos do presidente Lula houve um crescimento significativo dos ativos da Previdência Complementar fechada, saindo de R$ 240 bilhões, em 2003, para R$ 509 bilhões, em 2010. Acha que é possível a retomada do crescimento das EFPC?

Sim. os governos dos presidentes Lula e Dilma, entre 2003 a 2015, foram um período de grande desenvolvimento da previdência complementar. Tivemos (e eu participei quando fui diretor/Secretário do SPC – Serviço de Proteção ao Crédito; e Superintendente da Previc, e, depois, quando presidi por nove anos a Funpresp-Exe): a Emenda Constitucional nº 41 de 2003; a Lei 11.053, de 2004 (novo regime tributário com a tabela regressiva); a figura do Instituidor; o Decreto 4.942, de 2003 (regime disciplinar); a Lei nº 12.154, de 2009 (que criou a Previc, o Conselho Nacional de Previdência Complementar – CNPC, a Câmara de Recursos da Previdência Complementar – CRPC, instituiu o Termo de Ajustamento de Conduta – TAC); abertura do segmento de investimentos no exterior (Resolução CMN 3792, de 2009), Lei 12.618 de 2012 (que criou as Funpresp e introduziu o Regime de Previdência Complementar – RPC para os servidores públicos); Lei 13.183, de 2015 (que criou a adesão automática para os servidores públicos federais). Ou seja, o setor teve atenção.

Mas vamos ter que reconstruir o trabalho a partir da discussão sobre a necessidade de revisão do excesso regulatório e sancionatório, das facilidades de retirada de patrocínio e da financeirização dos planos previdenciários. Para isso, de forma dialogada com os atores do sistema, poderemos realizar um diagnóstico e propor medidas que retomem esse crescimento e importância da previdência complementar.

Dentre os objetivos da agenda da Previc a partir de 2023, com base no Relatório de Transição de 2022 para um novo governo democrático e popular, como já divulgado anteriormente, estão:

  1. Resgatar os direitos e a proteção dos interesses dos participantes e assistidos
  2. Descriminalizar os fundos de pensão e incentivar o ato regular de gestão
  3. Fomentar o crescimento da previdência complementar no Brasil
  4. Implantar efetivamente a supervisão baseada nos riscos
  5. Rever a financeirização dos planos de benefícios, em especial para os servidores públicos
  6. Aprovar o novo regime sancionador
  7. Reincorporar o segmento de imóveis, aperfeiçoar os investimentos em FIP e abrir um segmento de aplicação em economia de baixo carbono
  8. Fortalecer a atuação da Previc no desenvolvimento da previdência complementar

O cenário internacional e nacional parece não indicar boas perspectivas para os investimentos no curto prazo, principalmente em função do baixo crescimento econômico e a pressão inflacionária. Quais seriam as alternativas de alocação para entidades fechadas de previdência complementar (EFPC) no médio e longo prazos? É possível construir algum mecanismo de mitigação de riscos para os investimentos na economia real?

Acredito que teremos inicialmente que fazer alguns aperfeiçoamentos nas diretrizes de investimentos da Resolução CMN 4994 para oferecer maior segurança jurídica e clareza na definição da montagem da carteira de investimentos das EFPC.

Os investimentos em fundos de investimentos em participações (FIP) realizados pelos fundos de pensão por exemplo foram, de maneira indevida, criminalizados depois da operação Greenfield. Os dirigentes estão receosos de aportar recursos nesse segmento Estruturado e muitas oportunidades de investimentos foram perdidas. Muitas Políticas de Investimentos das EFPC hoje em dia já proíbem, pelo Conselho Deliberativo, aplicações nesses fundos de investimentos com medo de autuações do órgão de fiscalização.

Vamos ter que incentivar o ato regular de gestão e inverter a lógica atual de desconfiança nos dirigentes.  O objetivo do órgão de supervisão é zelar pela higidez e equilíbrio financeiro-atuarial do setor de previdência, fiscalizar condutas, incentivar melhores práticas de gestão e governança e não apenas aplicar sanções.

Para investimentos na economia real pretendemos reinserir o segmento de imóveis nas diretrizes de investimentos do Conselho Monetário Nacional (CMN).  Hoje em dia vemos fundos de pensão canadenses (CPPIB, CDPQ e OTPP), por exemplo, investindo no Brasil com participação acionária neste segmento e as fundações brasileiras com restrições para aplicar recursos em imóveis.

Além disso o Brasil tem enorme potencial na economia de baixo carbono e, portanto, a ideia é sugerir ainda a inclusão de um segmento específico nas diretrizes do CMN relativo à transição energética para as alocações das EFPC, contribuindo com a redução dos impactos das mudanças climáticas e com o desenvolvimento econômico, já que o Brasil tem uma posição estratégica em função da abundância de recursos minerais.

Quando a taxa de juros real for menor no País a perspectiva é que se abra um novo ciclo e que ocorra um rebalanceamento nas alocações da carteira de investimentos das EFPC no médio e longo prazo. E dessa forma, os mecanismos de mitigação de riscos vão ter que ficar mais claros e bem definidos na regulação da previdência complementar e nas diretrizes de investimentos do CMN, visando oferecer maior segurança jurídica para os dirigentes das Fundações.

Cerca de 80% dos ativos da previdência complementar estão concentrados em títulos do governo (renda fixa), o que impõe uma estagnação do sistema. Na sua opinião, qual a motivação para este perfil de alocação?

Os fundos de pensão são estratégicos na formação da poupança previdência estável e de longo prazo, sendo capaz de realizar investimentos na economia real e contribuir para o desenvolvimento do País, mas isso depende das condições macroeconômicas de estabilidade de preços e de juros reais baixos, além é claro de boa regulação prudencial com balanço de risco e diversificação do portfólio entre as classes de ativos, observado as características do plano de benefícios.

As últimas Resoluções do CMN e do CNPC direcionaram as EFPC para uma concentração em renda fixa, em contraste com o portfólio dos fundos de pensão em outros países desenvolvidos. Esse perfil atual de alocação em TIP pelas EFPC talvez tenha decorrido também da insegurança recente do processo sancionador da Previc que puniu os dirigentes por aplicar recursos em FIP ou em outras modalidades de investimentos alternativos.

Os órgãos fiscalizadores adotaram nos últimos anos uma postura meramente punitiva em detrimento do papel pedagógico preconizado na nossa legislação. Acha que isso pode ter contribuído para concentração em renda fixa para fugir à tomada de risco por parte dos dirigentes das entidades de previdência complementar? O que fazer para realinhar os procedimentos?

Vai ser um trabalho de todo o sistema, a credibilidade é o nosso produto principal e devemos trabalhar para recuperar o setor de previdência complementar, fazer crescer e aumentar a formação de poupança previdenciária com o objetivo de formar um segundo pilar de proteção social e contribuir para o crescimento econômico do País.

Para realinhar esse propósito, teremos que rever o Decreto nº 4.942, de 2003, e avançar na consolidação e efetividade da supervisão baseada em riscos (desenvolvida em 2011 com o Banco Mundial) das operações das EFPC, além de fortalecer o ato regular de gestão, previsto na Resolução CGPC nº 13, de 2004.

Uma das nossas preocupações é contribuir para recuperar a imagem do sistema de previdência complementar fechado, tão abalado pela avalanche de notícias negativas. Entendemos que este é um negócio que depende da confiança dos trabalhadores. O que fazer para que as EFPC voltem compor as páginas de economia nos noticiários?

Com a implementação de uma agenda positiva para o sistema. O setor hoje em dia somente discute a retirada de patrocínio. Pretendo criar uma área na Previc voltada para o fomento da previdência complementar que possa canalizar e integrar as ações de melhoria do ambiente da previdência complementar.

Como exemplo, durante a pandemia (2020 a 2022) o Brasil teve 70 novas empresas que abriram o capital na bolsa de valores e nenhuma delas abriu um plano ou uma EFPC. Isso é sintomático do estágio em que o segmento se encontra de estagnação/declínio, com muita regulação, excesso de exigências e incertezas no processo de supervisão, que podem estar inibindo o crescimento da previdência complementar. Do Estado se espera que ofereça as condições regulatórias adequadas para que o setor possa se desenvolver.

Nossa percepção é que o órgão regulador fez opção por privilegiar o mercado das entidades abertas, sob a justificativa de “harmonização do Sistema”, como demonstrado no projeto de revisão das Leis 108 e 109, apresentado pelo IMK. Como enfrentar esta disputa de mercado, quando os próprios atores do sistema contribuem para isso?

Poderíamos pensar essa harmonização em termos de tributação dos planos de benefícios, igualando as regras tributárias. Em outros aspectos, as entidades fechadas devem se diferenciar das abertas, ressaltando-se as qualidades do sistema fechado, ou seja, sem finalidade lucrativa, boa governança, baixo custo e pagamento de aposentadorias e pensões. Na verdade, ao propor essa “harmonização” estamos nos igualando às entidades abertas de previdência complementar (EAPC), vinculadas aos bancos e seguradoras. Penso que o antigo projeto de lei do IMK (ou até mesmo o projeto de lei do DEST/ME) deveria ser abandonado e rediscutido em bases mais sustentáveis e de crescimento dos planos previdenciários administrados pela EFPC, levando em conta também os interesses dos participantes e assistidos.

A Anapar apresentou várias propostas para a equipe de transição de governo, dentre elas a composição de um grupo de trabalho para revisitar o marco regulatório do Sistema. O senhor acredita que é possível atender a esse pleito?

O diagnóstico do Grupo de Trabalho da Transição Governamental de 2022 apontou que o excesso regulatório dos últimos quatro anos deveria ser revisto, com prioridade para temas fundamentais neste novo cenário democrático, como a retirada unilateral de patrocínio, o indexador do plano, a marcação de títulos a mercado, a regra de solvência dos planos e a suspensão das contribuições extraordinárias.

A orientação inicial é que se forme um diálogo quadripartite (participantes, patrocinadores, EFPC e governo) e se construa um diagnóstico do marco regulatório e de supervisão da previdência complementar, com aperfeiçoamento das Leis Complementares 108 e 109/2001, o Decreto 4.942/2003, e as diretrizes de investimentos. Depois desse diagnóstico seriam propostas medidas de simplificação, desoneração e fomento da previdência complementar no País.

O diálogo nesse momento talvez seja o melhor caminho para aperfeiçoar e fomentar as atividades da previdência complementar. Escutar as críticas e sugestões dos principais atores talvez seja o ideal, em especial dos participantes e assistidos. Falo isso inclusive como participante de plano de benefícios e ex-dirigente de uma EFPC.

Ainda sobre as propostas apresentadas, há uma sugestão de sobrestamento de algumas decisões da Superintendência e de suspensão das contribuições extraordinárias durante o período de atuação do Grupo de Trabalho para revisão das normas, resguardada as análises de viabilidade para cada Entidade.  Como o senhor avalia essas possibilidades?

Observados os ditames legais e normativos, esse momento inicial talvez pudéssemos repensar e melhorar as práticas do Estado, no que tange a regulação e supervisão, perante as operações das EFPC. O setor já demonstrou sua força e importância para a economia do País. Formamos poupança estável e de longo prazo, temos vocação previdenciária.

Um debate que está muito presente no segmento diz respeito ao aperfeiçoamento dessas regras de solvência que levem em conta a distinção dos aspectos conjunturais e estruturais no desenho do plano previdenciário.

Temos assistido no período pós-pandêmico a implantação de alguns programas de perdão de dívidas (total ou parcial), tanto para pessoas físicas quanto para empresas e entes federativos. Neste sentido, talvez pudéssemos estudar, preservando uma linha de solvência e liquidez dos planos, o pagamento regular da folha de benefícios e a discricionariedade dos órgãos estatutários da EFPC, com a suspensão temporária da contribuição extraordinária até que se desenhe uma regra mais robusta no médio e longo prazo dos parâmetros atuariais, demográficos, econômicos e de solvência dos planos de benefícios.

Da Redação da CUT

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